sábado, 7 de novembro de 2009

O que é a Solidão?

“Se possuísse uma canoa e um papagaio, podia considerar-me realmente como um Robinson Crusoé, desamparado na sua ilha. Há, é verdade, em roda de mim uns quatro ou cinco milhões de seres humanos. Mas, que é isso? As pessoas que nos não interessam e que se não interessam por nós, são apenas uma outra forma da paisagem, um mero arvoredo um pouco mais agitado. São, verdadeiramente como as ondas do mar, que crescem e morrem, sem que se tornem diferenciáveis umas das outras, sem que nenhuma atraia mais particularmente a nossa simpatia enquanto rola, sem que nenhuma, ao desaparecer, nos deixe uma mais especial recordação. Ora estas ondas, com o seu tumulto, não faltavam decerto em torno do rochedo de Robinson - e ele continua a ser, nos colégios e conventos, o modelo lamentável e clássico da solidão”. Queirós, (s/d), in Correspondência.

Solidão não é o mesmo que estar desacompanhado. Muitas pessoas passam por momentos em que se encontram sozinhas, seja por força das circunstâncias ou por escolha própria. Estar sozinho pode ser uma experiência positiva, realizada por prazer e trazer alívio emocional, desde que desejado e controlado pelo indivíduo. É, geralmente, uma escolha consciente. (Neto, 2004).
Durante o crescimento como indivíduo, o ser humano começa um processo de separação ainda no nascimento, a partir do qual continua a ter uma independência crescente até a idade adulta. Desta forma, sentir-se sozinho pode ser uma emoção saudável e, de facto, a escolha de ficar sozinho durante algum período pode ser enriquecedor. (Neto, 2004).
Solidão é um sentimento em que uma pessoa sente uma profunda sensação de vazio e isolamento. É mais do que o sentimento de querer uma companhia ou querer realizar alguma actividade com outra pessoa. (Neto, 2004).
Para sentir solidão, o indivíduo passa por um estado de profunda separação. Isto pode-se manifestar em sentimentos de abandono, rejeição, depressão, insegurança, ansiedade, falta de esperança, inutilidade, insignificância e ressentimento. Se tais sentimentos forem prolongados poderão tornar-se debilitantes e bloqueadores para a capacidade do indivíduo em ter um estilo de vida e relacionamentos saudáveis. Se o indivíduo estiver convencido de que não pode ser amado, aumentará a experiência de sofrimento e o consequente distanciamento do contacto social. É que, a baixa auto-estima pode dar início à desconexão social que pode levar à solidão. (Neto, 2004).
A solidão ocorre com frequência em cidades densamente populosas; nestas cidades muitas pessoas podem sentir-se totalmente sozinhas e deslocadas, mesmo quando rodeadas de pessoas. (Neto, 2004).
Elas sentem a falta de uma comunidade identificável numa multidão anónima. É incerto se a solidão é uma condição agravada pela alta densidade populacional ou se é uma condição humana trazida à tona por tal estrutura social. De facto a solidão ocorre mesmo em pequenas populações, mas a quantidade de pessoas aleatórias que entram em contacto com o indivíduo diariamente numa cidade grande pode levantar barreiras de interacção social, uma vez que não há profundidade nas relações, e isso pode levar à sensação de deslocação e solidão. A quantidade de contactos não se traduz na qualidade dos contactos. (Neto, 2004).

“Solidão procura solidão e, quanto mais uma pessoa se isola, à medida que o tempo vai passando, mais isolada quer estar. Quando as pessoas se apercebem que a solidão é a sua companhia, o rosto entristece, a alma desvanece, um forte pesar parece invadir o pensamento. O cenário torna-se deprimente. O futuro sem esperança”. (Neto, 2004).

O facto de a solidão imperar nos dias de hoje de uma forma cada vez mais atroz, também arrasta consigo outros problemas de saúde, como vamos ver nas citações a seguir referidas.

“O número de pessoas que vivem sozinhas, sem família ou companheiro(a) é cada vez maior nas grandes cidades da Europa e da América. Segundo alguns psicólogos, este grupo está mais exposto a sofrer de doenças físicas e psíquicas, o seu sistema imunológico mostra-se menos estável, menos forte e mais propício a contrair doenças crónicas”. (Neto, 2004).

“De acordo com Georg Gaul, da Sociedade Austríaca de Cardiologia, citado pela agência Efe, o risco de morte das pessoas que vivem sozinhas é o dobro das que permanecem acompanhadas. Perante o seu isolamento, muitos acomodam-se e acabam por adoecer com frequência, vitimados por úlcera no estômago, problemas no fígado e no aparelho digestivo, associados a uma crónica dor de cabeça”. (Neto, 2004).

A solidão é um conceito muito vago, daí surgirem várias opiniões de vários autores, contudo são unânimes em referir que a solidão é nefasta e causa problemas também sociais e relacionais.

“Mas o que é, afinal, a solidão? Para a psicóloga Paula Marques, «a solidão é um conceito vago que se reveste de muitos significados». E adianta: «Weiss (1973) afirma que a solidão não é apenas um desejo de relação mas da relação certa, podendo ocorrer concomitantemente com actividades sociais». Já «para Perlman e Peplau (1982), é uma experiência desagradável que ocorre quando a rede de relações sociais de uma pessoa é deficiente nalgum aspecto importante, quer quantitativa quer qualitativamente»”. (Neto, 2004).

“ «O âmago da solidão» acrescenta Paula Marques, «é a insatisfação em relação ao relacionamento social, não obrigatória nem necessariamente relacionada com o isolamento objectivo. Mesmo a própria noção de isolamento abrange formulações distintas como em termos de tempo passado só, falta de relações sociais, falta de contactos com familiares e existência ou não de um confidente». Assim sendo, «a solidão reflecte essencialmente uma discrepância subjectiva entre os níveis de contactos sociais desejados e realizados, podendo atingir dimensões psicopatológicas”. (Neto, 2004).

“O meio urbano, ao gerar diferentes dinâmicas de relacionamento entre os indivíduos, tende a marginalizar os mais fracos, incapazes de manter o seu ritmo e a apagá-los, retirando-lhes qualquer visibilidade social. Envelhecer na cidade é arriscar-se a acabar os seus dias cada vez mais só. Os idosos já não ocupam o lugar que tinham há sessenta anos. O respeito tornou-se menos profundo. Tem-se experiência mas é-se ultrapassado pelos jovens em matéria de conhecimentos; daqui advém o preconceito que nutrem os chefes de pessoal contra a colocação ou permanência no trabalho de um quinquagenário deixando caminho aberto à sensação de inutilidade”, frisa”. (Neto, 2004).

Fica também explícito que com a azáfama dos dias de hoje, as pessoas só têm tempo para o trabalho e cada vez mais desprezam os seus entes queridos. São os filhos que deixam os pais fechados em casa, é o chegar a casa stressado sem ter dois minutos para conversar com eles, são as férias e a entrada dos pais nos hospitais a aguardar a sua chegada. Enfim, é uma panóplia de situações que origina problemas graves de solidão.

“Apesar da boa vontade, os filhos não têm hoje as mesmas possibilidades que antigamente de tomar a seu cargo os pais idosos tanto mais que, na cidade, existe frequentemente o problema do alojamento. Estas mulheres evitam a todo o custo subir e descer escadas ou utilizar os meios de transporte concebidos apenas para pessoas ágeis», refere”. (Neto, 2004).

“Face à ruptura de equilíbrios tradicionais, em que o cuidar dos idosos constituía uma das responsabilidades das famílias e o envelhecer era um processo integrado num ciclo de vida/trabalho, bem mais curto e simples, será necessário intervir para encontrar novos equilíbrios adequados à situação actual”, defende. “Nos anos mais próximos haverá várias gerações de idosos, com elevados índices de analfabetismo e afastamento face aos progressos tecnológicos e sociais do presente, que exigirão um esforço redobrado de apoio”. (Neto, 2004).

Outro problema é talvez a falta de estratégia que tem imperado na temática da solidão, porque não reduzir a solidão dos idosos dentro do seu habitat, em vez de o retirar para locais comuns onde, no fundo, poderão ficar sós mas com gente à volta.

“Para muitos idosos, as redes sociais de apoio são frágeis, cenário porventura agravado pelo suporte familiar insuficiente, quando não perturbador», adverte. «A intervenção formal do Estado e autarquias, nas suas vidas, limitou-se com frequência à criação de novos espaços residenciais que não reflectem as necessidades e valores das pessoas a que se destinam. Não houve criação de equipamentos e serviços e, muito menos, a implementação de uma nova pedagogia de convivência que provocasse uma mudança de cultura, promovendo outras solidariedades”, refere Paula Marques. (Neto, 2004).

“Mas quem são, afinal, as principais vítimas da solidão? Se bem que alguns estudos mostrem uma maior associação da solidão a faixas etárias jovens, não se pode excluir a importância desta temática nos idosos, até pelo crescente envelhecimento das populações ocidentais acompanhado pela degradação das condições deste grupo numa sociedade que tem por arquétipos a juventude e a produtividade”. (Neto, 2004).

“Barreto refere ainda os níveis mais elevados de solidão em classes mais baixas por haver poucos interesses específicos bem como uma baixa capacidade de ocupação em actividades de satisfação pessoal. Tal poderá estar relacionado com a sua fraca instrução escolar ou a falta de experiência anterior na ocupação de tempos livres”. (Neto, 2004).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Neto, M. (2004). A solidão também mata. Disponível em http://dn.sapo.pt/inicio/interior.aspx?content_id=591870

Neves, P. (2008). Na mais profunda solidão. Disponível em http://aeiou.expresso.pt/na-mais- profunda-solidao=f475801

3 comentários:

  1. Em certas ocasiões, o provérbio "antes só do que mal acompanhado" é verdadeiro.

    ResponderEliminar
  2. Se a pessoa não se esforça para evitar a solidão, o que acontece?
    Gostaria de ver aumentar este trabalho.

    ResponderEliminar
  3. Para mim solidão é estar no meio de muitas pessoas e mesmo assim sentir-me só.
    Adorei o blog. Força para todos aqueles que se sentem mergulhados na solidão...

    ResponderEliminar